Carta de Esclarecimento à Sociedade sobre o TDAH, seu diagnóstico e
tratamento.
Recentemente, uma série de matérias sobre o Transtorno do Déficit de Atenção
e Hiperatividade (TDAH) tem sido veiculada pela mídia jornalística não
especializada. Em boa parte dessas matérias, profissionais apresentados como
especialistas em saúde e educação (embora seus currículos informem não terem
publicações científicas sobre o assunto) transmitem opiniões pessoais como se
fossem informações científicas. Pior, suas opiniões não refletem os
conhecimentos atuais sobre o transtorno, que é reconhecido pela Organização
Mundial da Saúde e sobre o qual constam centenas de publicações em bancos de
dados descrevendo claramente as graves
consequências nas esferas acadêmica, familiar, social e profissional. Tais
opiniões equivocadas são nocivas para pacientes, familiares e para a população
como um todo.
A afirmação de que o TDAH "não existe", de que os medicamentos aprovados pela
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para o tratamento desse
transtorno são "perigosos" e tornam as crianças "obedientes" é, na melhor das
hipóteses, expressão pública de ignorância em relação ao tema, investigado
cientificamente de modo extenso por pesquisadores de todo o mundo, muitos deles
brasileiros. Na pior das hipóteses, configura crime porque veicula informações
erradas sobre tema de saúde pública. Incontáveis Associações Médicas ao redor do
mundo já se posicionaram não deixando dúvidas sobre a validade do TDAH.
Tais matérias induzem os leitores à falsa conclusão que há dúvidas não apenas
quanto à existência do TDAH, como sobre os benefícios do tratamento
medicamentoso. Obviamente, tais textos jamais citam qualquer artigo científico,
nenhum dado de pesquisa, demonstrando os tais efeitos "perigosos" ou graves. E,
numa prova incontestável da natureza parcial e enganosa, em desrespeito aos
princípios básicos do jornalismo, deixam de citar centenas de artigos
científicos que documentam fartamente os benefícios, a eficácia e a segurança
dos medicamentos usados no tratamento do TDAH. Recentemente, um grande estudo
publicado no mais importante jornal Inglês de Psiquiatria documentou que o
metilfenidato é a medicação mais eficaz em Psiquiatria e uma das mais eficazes
em toda a Medicina.
Os sintomas que caracterizam o TDAH não são comportamentos infantis comuns,
meras variações da normalidade, que médicos, pais e professores querem
"controlar". Seria o mesmo que dizer que diabete é um mero aumento de açúcar no
sangue, uma simples variação do normal observado na população. Noventa e cinco
por cento das crianças e adolescentes não tem a intensidade e gravidade de
sintomas que os portadores de TDAH, do mesmo modo que 90% dos adultos não têm
níveis elevados de açúcar. Diagnósticos são frequentemente estabelecidos pela
intensidade e gravidade. A lista é grande: hipertensão arterial, glaucoma,
osteoporose, hipertireoidismo, etc. Todos eles, à semelhança do que ocorre no
TDAH, cursam com graves consequências para o indivíduo. Proposições do tipo
"quem não esquece alguma coisa de vez em quando?" ou "quem não responde
impulsivamente de vez em quando?" são, além de superficiais, irrelevantes: todos
os sintomas do TDAH ocorrem em frequência e intensidade não observada em
indivíduos normais.
O diagnóstico do TDAH é realizado através de entrevista clínica e há extensa
literatura científica sobre a fidedignidade deste procedimento. A sugestão de
que a ausência de exames complementares tornaria o diagnóstico "frágil"
novamente reflete inacreditável desconhecimento de saúde mental: também não há
exames para os diagnósticos de Depressão, Autismo, Transtorno do Pânico,
Esquizofrenia, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, Transtorno Bipolar, etc. A comunidade científica Brasileira, aqui representada por mais de 20 associações e grupos de pesquisa, reitera que o TDAH pode ser diagnosticado de modo fidedigno e seu tratamento, se bem conduzido, tem grandes chances de diminuir os prejuízos que esses indivíduos apresentam ao longo da vida. Embora tratamentos não farmacológicos possam auxiliar bastante no manejo terapêutico do TDAH, todos os artigos científicos disponíveis indicam que o tratamento farmacológico é a primeira escolha para a maioria dos portadores.
Fornecer informações equivocadas e ocultar dados científicos bem documentados
é dificultar ou retardar o acesso da população ao diagnóstico ou a tratamento, é
a expressão de uma das mais perversas formas de discriminação social: a
Psicofobia.
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