Escritor Raduan Nassar denuncia o Golpe!

ESCRITOR RADUAN NASSAR DENUNCIA O GOLPE NA ENTREGA DO PRÊMIO CAMÕES DE LITERATURA 

Um bate-boca aconteceu no Museu Lasar Segall durante a cerimônia de entrega do Prêmio Camões de Literatura, o mais importante da língua portuguesa, na manhã desta sexta-feira. Dilma ainda era a presidenta em exercício quando Raduan Nassar, autor dos livros Lavoura Arcaica e Um Copo de Cólera, foi agraciado com o prêmio. Desde que assumiu o governo por meio de um golpe parlamentar, Michel Temer vinha adiando a entrega da honraria, possivelmente temendo o discurso que Raduan faria. Não deu outra. Raduan chamou Roberto Freire de "ministro da Cultura do governo em  exercício" e, dirigindo-se ao embaixador de Portugal Jorge Cabral, afirmou que "vivemos tempos sombrios, muito sombrios". 

Após uma série de denúncias, passou a palavra para Freire, numa sequência pouco comum em eventos como este (em geral o homenageado é o último a falar). Freire, então, sugeriu que Raduan deveria recusar o prêmio. "É um adversário recebendo um prêmio de um governo que ele considera ilegítimo", comentou ao microfone, visivelmente incomodado, o que despertou vaias na plateia. Estavam presentes o escritor Milton Hatoum, a filósofa Marilena Chaui e o ex-chanceler Celso Amorim, entre outros. O poeta e professor da USP Augusto Massi prontificou-se a rebater o ministro. "Acho que você não está à altura deste evento", disse, em voz alta. "O silêncio é precioso", disse Marilena Chaui, também interpelando Roberto Freire.   

Confira a seguir o discurso feito por Raduan:

Excelentíssimo Senhor Embaixador de Portugal, Dr. Jorge Cabral.

Senhor Dr. Roberto Freire, Ministro da Cultura do governo em exercício.

Senhora Helena Severo, Presidente da Fundação Biblioteca Nacional.

Professor Jorge Schwartz, Diretor do Museu Lasar Segall.

Saudações a todos os convidados.

Tive dificuldade para entender o Prêmio Camões, ainda que concedido pelo voto unânime do júri. De todo modo, uma honraria a um brasileiro ter sido contemplado no berço de nossa língua.  

Estive em Portugal em 1976, fascinado pelo país, resplandecente desde a Revolução dos Cravos no ano anterior. Além de amigos portugueses, fui sempre carinhosamente acolhido pela imprensa, escritores e meios acadêmicos lusitanos.

Portanto, Sr. Embaixador, muito obrigado a Portugal.

Infelizmente, nada é tão azul no nosso Brasil.

Vivemos tempos sombrios, muito sombrios: invasão na sede do Partido dos Trabalhadores em São Paulo; invasão na Escola Nacional Florestan Fernandes; invasão nas escolas de ensino médio em muitos estados; a prisão de Guilherme Boulos, membro da Coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto; violência contra a oposição democrática ao manifestar-se na rua. Episódios todos perpetrados por Alexandre de Moraes.

Com curriculum mais amplo de truculência, Moraes propiciou também, por omissão, as tragédias nos presídios de Manaus e Roraima. Prima inclusive por uma incontinência verbal assustadora, de um partidarismo exacerbado, há vídeo, atestando a virulência da sua fala. E é esta figura exótica a indicada agora para o Supremo Tribunal Federal.

Os fatos mencionados configuram por extensão todo um governo repressor: contra o trabalhador, contra aposentadorias criteriosas, contra universidades federais de ensino gratuito, contra a diplomacia ativa e altiva de Celso Amorim. Governo atrelado por sinal ao neoliberalismo com sua escandalosa concentração da riqueza, o que vem desgraçando os pobres do mundo inteiro.

Mesmo de exceção, o governo que está aí foi posto, e continua amparado pelo Ministério Público e, de resto, pelo Supremo Tribunal Federal.

Prova da sustentação do governo em exercício aconteceu há três dias, quando o ministro Celso de Mello, com suas intervenções enfadonhas, acolheu o pleito de Moreira Franco. Citado 34 vezes numa única delação, o ministro Celso de Mello garantiu, com foro privilegiado, a blindagem ao alcunhado “Angorá”. E acrescentou um elogio superlativo a um de seus pares, o ministro Gilmar Mendes, por ter barrado Lula para a Casa Civil, no governo Dilma. Dois pesos e duas medidas

É esse o Supremo que temos, ressalvadas poucas exceções. Coerente com seu passado à época do regime militar, o mesmo Supremo propiciou a reversão da nossa democracia: não impediu que Eduardo Cunha, então presidente da Câmara dos Deputados e réu na Corte, instaurasse o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Íntegra, eleita pelo voto popular, Dilma foi afastada definitivamente no Senado.

 O golpe estava consumado!

 Não há como ficar calado.

 Obrigado


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